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vivendo em economia fechada, ou semi-fechada, caracterizada por
uma atividade vital (pastoreio, caça, pesca ou coleta silvestre), ou
pela associação estreita desta economia com um meio geográfico
de produção - gênero de vida dos rizicultores do Extremo-Oriente,
gênero de vida dos montanheses etc ” (cf. Pierre George, 1974. p.
201).
No Brasil, os exemplos típicos de gênero de vida são
difíceis de ser encontrados. Seriam, por exemplo, o tipo social
representado pelo caboclo amazônico, ou pelo seringueiro, ambos
vivendo na floresta e dela dependendo para sua sobrevivência? Em
Goiás, seriam então os Kalunga que, de um certo modo, ainda
vivem isolados do resto da sociedade e cultivam hábitos e costumes
que lhes foram transmitidos pelos seus ancestrais de origem
africana e que, também de um certo modo, ainda levam uma vida
de auto-suficiência, logo, de auto-sustentação, praticamente
desconhecendo a economia de mercado? Aliás, permanece, aqui, a
interrogação: verdadeiramente, teríamos, no Brasil em geral e em
Goiás em particular, um exemplo típico de gênero de vida nos
moldes lablachianos fora das comunidades indígenas ou de algum
enclave raro, como o dos Kalungal Teriam os remanescentes de
quilombolas um verdadeiro gênero de vida ou aquele tipo de
atividade cotidiana não passaria de uma estratégia de liberdade e
sobrevivência? Em sentido amplo, os casos aqui evocados -
caboclos amazônicos, seringueiros, castanheiros, kalungas - podem
servir de exemplo. Mas em sentido restrito, talvez não haja, no
Brasil, exemplo mais claro do que vem a ser gênero de vida fora
das comunidades indígenas ainda pouco aculturadas, ou fora do
que, até recentemente, eram os homens do brejo ou da serra,
retratados por Alberto Ribeiro Lamego, a exemplo de como ainda o
são, no Japão, os criadores de ostras, ou, na Indochina, os
rizicultores.
A verdade é que ao falar-se, hoje, de gênero de vida corre-
se o risco, alerta Pierre George (icL, ibid.), como o fez Max. Derreau
em sua Nqtion de Genre de Vie (Noção de Gênero de Vida), de se
confundir um comportamento profissional - os ferroviários, os
garimpeiros, os canavieiros, os vaqueiros de um modo geral, os
pescadores da Lagoa dos Patos ou os catadores de castanha-do-
Pará - com a integração de uma atividade a uma economia e a uma
sociedade globais.
Paul Vidal de La Blache concluía, enfim, que “a Geografia
era o estudo científico dos lugares. Este conceito foi certamente um
dos mais amplamente debatidos e discutidos em diferentes
congressos, simpósios e salas de aula por certamente milhares de