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Isso apenas me fez pensar um pouco e pensando e revendo a literatura
me pareceu que não era o único caso de coincidência de cacos de duas
tradições que são contemporâneas e parece que as vezes intercaladas.
Ao lançar a hipótese, estava tentando suscitar o reexame do problema
de preferência pelo próprio Igor, mas ele não quis mexer. Para mostrar
que estou ciente do problema, no último parágrafo citei que não devia
ser eu, que trabalho na periferia da distribuição, a propor uma mudança
no interior. (Miller, 1978:33).
Era isso o que queria apresentar sobre Kaingáng.
Pedro Ignácio Schmitz:
Quero complementar a apresentação de Tom Miller,
oferecendo um esboço das tradições ceramistas do Sul do Brasil,
através de dois mapas, um referente a colonização dos grupos
ceramistas Tupiguarani (mapa 3), o outro com a distribuição das
tradições ceramistas Itararê/Casa de Pedra, Taquara e Vieira (mapa 2).
Começo com as tradições Itararê/Casa de Pedra e Taquara do
planalto sul-brasileiro. Quando sobrepomos a área de expansão dessas
tradições a um mapa da distribuição da vegetação, observamos que
corresponde à mata mista com pinheiros, entremeada de campos.
Alguns elementos são comuns nas tradições do planalto sul-brasileiro:
habitações subterrâneas, cerâmica pequena temperada com restos
minerais, geralmente bem finos, de formas semelhantes e decorada
com técnicas semelhantes. Percebe- se uma diminuição da decoração
plástica do sul a norte, da tradição Taquara para a tradição Itararê/Casa
de Pedra. Os grupos parecem ter forte apoio em coleta, onde sobres
saem os pinhões e os moluscos marinhos, e na caça. Seu domínio de
plantas cultivadas parece ter sido pequeno e concentrado na utilização
de grãos semeados, sem possibilidade de cultivar mandioca por causa
do frio das alturas. Os solos pobres não lhes permitiriam expandir os
cultivos, com o que se viam obrigados a explorar cuidada samente a
apropriaçao de produtos naturais da mata, do campo e do litoral, para
cobrir o ano inteiro.
As datas mais antigas da tradição Taquara estão no nordeste
do Rio Grande do Sul, onde são conhecidos desde AD 140. As datas
mais antigas da tradição Itararé/ Casa de Pedra estão sobre o rio Iguaçu
e remontam a AD 420.
Seus descendentes genéricos devem ser considerados os
Kaingáng, cuja área de expansão parece coincidir com essas tradições
pré-históricas, o que recoloca o problema do que representariam de
fato, em termos de grandes sistemas culturais, as pequenas diferenças
encontradas na cerâmica, registradas entre as tradições Taquara,
Itararé e Casa de Pedra. Tudo indica tratar-se de “fácies” cerâmicas de
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